terça-feira, 10 de março de 2020

Normalidades

Resultado de imagem para sala de policia para interrogatorio


- Diga seu nome e idade.
- Eduardo…
- Olhando pra câmera por favor.
- Eduardo Santana, 33 anos.
- Por favor, peço que não se mova muito ao falar – ruido do zoom da câmera – essa luz aqui vai acender e após minha apresentação peço que repita seu nome, idade e pode começar. - Luz vermelha – Sanatório Nacional de Brasília. Vinte e um do seis de mil novecentos e setenta e oito. Paciente zero, quatro, três.
- Eduardo Santana, 33 anos – respiração profunda – eu não sei como cheguei aqui…
- Por favor, só comece.
- Ok.
“Eu não me considero alguém especial. Minha casa era de telha ruim onde chovia gotas sem fim em panelas velhas de alumínio que ficavam espalhadas pelo lar. Talvez esse seja o melhor resumo sobre minha vida. Gotas sem fim e panelas barulhentas espalhadas por todo lado. Não melhor que uns nem pior que outros. Apenas mais um. Algumas pessoas não entendem porque fiz, o que fiz – pausa – eu tenho certa dificuldade em entender elas. Na verdade eu tenho dificuldade de entender muita coisa. Umas eu desisti, e as demais são inúteis demais para ocupar meus pensamentos. Acredito que é isso que acontece aqui. Uma das leis não descobertas ainda é a Lei do Foda-se. O fato de algumas coisas estarem tão obvias e não serem resolvidas me obriga a pensar que os responsáveis por isso, tem total incapacidade braçal e mental pra entender a facilidade e urgência de alguns casos. Se utilizando assim da Lei básica do Foda-se. Eu não to nem aí, é irrelevante, foda-se. Temos casos muito simples. Tipo, porque ainda somos animais desesperados pelo poder? Se a redistribuição da renda mundial facilitaria de fato a solução social, politica e mundial de uma boa parte da humanidade, porque de fato não fazemos? Porque mesmo tendo consciência dos maus da religião e de todo o resto dessa conversa espiritualística, ainda fazemos o que fazemos? Nós matamos, exploramos, humilhamos, invadimos e estupramos culturas e espécies inteiras mesmo com as vistas na verdadeira solução. É doença e guerra civil pra dar com pau. Abuso de minorias e perseguições absurdamente criativas. Todos problemas de fácil solução. Digo fácil, mas não rápido. E é ai que a gente se perde. Quem quer esperar tanto tempo? Quem quer arriscar perder quando se joga com a segurança financeira, psíquica e social? Dividamos as terras, distribuímos racionalmente o dinheiro, ajudemos os órfãos e imigrantes, sejamos capitalistas de fato. Um capitalismo onde se pode consumir, não mais como gafanhotos, e sim como abelhas ou formigas. Sei lá. A imaturidade dessa estrutura egocêntrica é espelho das engrenagens minúsculas que fazem ele continuar atrasado como está. Imaturidade essa fortalecida pela construção genética de sobrevivência, que desperta a essência de todo esse mal; a ganância desenfreada e o exagerado medo da morte. Nosso mundo nada mais é do que reflexo de seres humanos com sérios distúrbios mentais. Um freudiano culparia a paternidade ausente, um marxista a família falida, um deísta a ausência divina e eu só acho burrice mesmo. Olhar todas as crises globais é basicamente a mesma coisa que olhar para as micro crises pessoais. Indivíduos estranhante desequilibrados e carregados de pensamentos e construções impostas por sua realidade cega. Cega pois também causamos e mantemos conflitos desnecessários dentro de nossas minúsculas bolhas sociais. Problemas que podem ser resolvidos com a verdade, bem dita e sem interferenciais ridículas herdadas por acontecimentos que já deixaram de ser relevantes. Relacionamentos abusivos entre amantes, parentes, amigos e vizinhos. Desrespeito com as escolhas de sexo, crença ou a porra de um time de futebol. Olhares tortos para a especie que escolheu outro do mesmo sexo para dividir risos e orgasmos eternos. Mini guerras civis travadas entre amigos e famílias que discordaram de pequenos detalhes da vida, causando um pandemônio sem fim de traumas e culpa. Um jogo de responsabilidades onde o outro que é sempre causador das dores da minha alma e ditador de meus sentimentos. São todos idiotas. Porque não param? O que pode ser maior do que o sacrifício pela paz? Sacrificar o ego, as certezas e tudo isso que cultivamos com tanto carinho durante todos esses irrelevantes anos de nossas vidas, é tão apocalíptico assim? É onde digo que algumas coisas eu não entendo. A burocracia politica invadiu nossos corações. São oficios demais para serem preenchidos e quem nos atende é um funcionário do governo puto com seu serviço de merda. Então é isso, se me perguntarem porque matei todas aquelas pessoas a resposta seria essa; não tenho paciência pra gente burra. O fato de odiar goteiras também me prejudica”

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