quinta-feira, 27 de setembro de 2018

Cotidiano


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  Madrugada. A luz da geladeira ilumina a cozinha. Lá dentro, garrafas de água quase vazias e algumas frutas e vasilhas com algum resto de comida de uma semana atrás. Maturidade é conseguir encher as garras ao invés de guardar vazias sem utilidade nenhuma.
     Pego o leite e tomo direto na garrafa. Não entendo porque algumas pessoas ainda não tomam leite puro. É melhor e ainda ajuda a tirar aquele gosto ruim de qualquer coisa da boca. Leite é vida. A água ajuda um pouco também.
     Sento na bancada do lado da fruteira com bananas pretas e aparentemente podres. Aparentemente. As bananas sempre enganam. Aprendizado importante pra quem mora só. Do contrário das maçãs, que na maioria das vezes fazem a gente parecer que está mordendo poliestireno. Isopor. Tipo esponja de aço que a gente chama de Bombril.
     Tento entender que horas são mas o escuro não deixa eu ver o relógio da parede com precisão. Odeio aquele tique taque ensurdecedor que os ponteiros fazem quando não estão acompanhados por algum som comum do dia a dia. Mas aquele era presente, tinha que ficar lá, fazendo zoada pela casa toda. De toda maneira não importa, é madrugada. As horas não são menos relevantes. Só quando passa de quatro horas, que é quando o sono é mais gostoso e você sabe que tem pouco tempo pra se fingir de morto em cima da cama.
     Melhor ir dormir. Fecho a geladeira.
     Nas sombras de cantos sempre tem algum vulto satânico esperando minha alma pura vacilar pra me carregar pro inferno. Maldito instinto de sobrevivência, o medo nos preserva mas nos limita. Aos poucos meus olhos se aclimam com a escuridão e consigo discernir melhor os demônios.
     Meu peito dói. Dói mais um pouco. Paro e me apoio na porta. A dor vem mais forte. Finco os dedos apertando o peito inutilmente.
     Vejo a garrafa de leite na bancada enquanto vou de encontro ao chão.
     - Eu devia ter enchido as garrafas de água.

segunda-feira, 17 de setembro de 2018

Brócolis



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- como a gente sabe que gosta de alguma coisa papai?
- como assim filho?
- tipo, como eu sei que gosto de sorvete?
- simples filhote. Coloca na boca, se gostar, você gosta. Se não gostar, não gosta.
- e de brócolis?
- brócolis é um pouco difícil no começo mas depois fica uma delícia.
- e se não ficar?
- sempre fica. E mesmo que você não ache tão bom, faz bem pra saúde.
- então eu tenho que gostar daquilo que não gosto porque isso faz bem pra alguma coisa?
“Ele tem só 6 anos mesmo?”, pensou o pai.
- sim – respondeu – algumas coisas são ruins mas a gente acostuma.
A criança abaixou a cabeça um pouco para refletir e continuou;
- como saber então do que eu gosto de verdade?
- por que está preocupado em saber disso?
- porque minha tia falou que eu tenho que andar com pessoas que gostam das mesas coisas que eu, mas se eu não sei do que gosto de verdade, como sei que vou estar andando com pessoas que gosto?
- você acha isso difícil?
- sim – respondeu desanimado.
- vou te ajudar. A maneira mais fácil e simples de te responder seria dizendo que você deve conhecer tudo pra descobrir do que gosta ou não. A maioria das pessoas acredita que seja simples assim, mas pensar nisso é um trabalho e tanto. Tudo que você veste, vê, come, assiste, fala e tudo mais, é um conteúdo produzido por alguém que lá atrás teve um certo interesse em te passar isso. As músicas que você ouve são importadas e enfiadas no seu ouvido. Essas por sua vez se repetem ao longo dos anos e aquele “brócolis” de música acaba se tornando um lindo pudim delicioso depois de tanta insistência. Isso acontece com tudo hoje. Comida, roupa, teatro, religião, livros, noticia, tudo. Todas as informações que você tem hoje são alimento para deixar a sua bolha funcionando...
- bolha?
- isso. Exemplo; seus colegas são Cristãos?
- sim.
- por que, dentre milhares de religiões no mundo, seus colegas são cristãos?
- não sei – respondeu curioso.
- não posso dizer por tudo mundo, mas em geral, eles adoram ao único deus porque os pais fazem isso e os pais dos pais também e por ai vai. E se você voltar bastante no tempo vai descobrir que alguém lá atrás chegou e disse que ser cristão era bom. Existem religiões de mais de quatro mil anos antes de Cristo, porque o cristianismo, que tem uns dois mil anos, é a certa? Isso é a Bolha que falei. As pessoas se apegam as coisas que fazem sentido pra elas e as defendem sem nem saber suas origens. Isso serve para todas as outras culturas com religiões ou costumes diferentes.
- então é errado ser cristão?
- é errado ser idiota meu amor. Todo mundo pode ser o que quiser.
- então eles estão errados mas não estão errados?
- pra dizer que algo não é verdadeiro ou está errado, você sempre tem que ter a resposta certa, a verdade ou o padrão que deve ser usado como medida. Eles não estão errados, só medem o mundo pela bolha deles. Assim também na política, música, moda e essas coisas.
- confuso.
- é. Eu sei. Também acho estranho.
- mas o mundo é enorme, como eu vou conhecer tudo pra saber do que gosto?
- isso é impossível filhote. Mas posso te dar uma sugestão que acho que vai gostar.
- qual? – olhou esperançoso.
- goste de gostar das coisas. Comece pelas coisas simples; comida, roupa, música. Depois avance. Converse com pessoas opostas a você, vá em ambientes que você antes se sentia um peixe fora da agua. E por último e mais difícil, olhe pra você.
- no espelho?
- não – riu – na alma. Descubra se alguns sentimentos e atitudes que você tem são realmente seus ou se alguém um dia te deu ele igual deram o cristianismo pros seus colegas. A gente aprende a ficar com raiva quando alguém nos irrita, a chorar quando nos magoam, a rir quando nos alegram e no final estamos num fluxo eterno de ação e reação na confiança de que tudo isso é o “Eu” que defendemos com tanta força. Algumas coisas são instinto, coisa de animal, outras são enfiadas na gente sem a gente pedir. Não fugir disso é aceitar a sua bolha como ela é.
- e isso é ruim?
- não. De maneira nenhuma. Como eu disse, pra dizer se é certo ou não você deve ter a verdade pra usar de padrão. E tome cuidado, porque em todas as bolhas existem verdades irrefutáveis.
- mas papai, como vou saber se eu também não estou numa bolha?
- bolhas são universos particulares de cada um ou de um certo grupo de pessoas. Se você conseguir conviver com todas elas, e eu digo CONVIVER mesmo, entendendo os motivos para as pessoas estarem ali fazendo ou vivendo como estão, você está no caminho certo.
- entendi.
- quer um sorvete pra comemorar?
- acho que vou querer um brócolis papai.

quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Xiva

Shiva ou Xiva é um deus ("Deva") hindu, o Destruidor (ou o Transformador), participante da Trimurti juntamente com Brama (Brahma), o Criad...


Novamente tudo se dissolve
E Xiva demostra todo seu poder
Reencarnações de destruição
Insistem em subsistir

Ó grande deusa
Do equilíbrio e do fim
Designifique-me até um ser
Que seja capaz de renascer

E que a morte,
Essa que embeleza tua vida
Seja sempre guia
Para luz, sol que irradia

Ioga, chacra, salve rei
De todos os deuses e belezas
Tu só és a mais temida
Porque a morte é teu zelar

segunda-feira, 10 de setembro de 2018

Abandone seus amigos


Atividades, desenhos, moldes, cânticos, vídeos e joguinhos bíblicos para o apoio do Ministério Infantil da Igreja.


Abandone seus amigos.
Vá ao cinema sozinho.
Sente na praça.
Faça um lanche.
Leia duas páginas de um livro debaixo de uma árvore.
Porque não importa terminar,
Mas sempre continuar.
Tome vinho só
Ao som de uma música ruim.
Algumas coisas só têm seu valor no silêncio.
Abrace um desconhecido.
Fique em casa.
Saia.
Busque a alegria da solidão.
Não tenha medo.
Aceite que você é uma péssima companhia
E se leve pra tomar um porre.
Vá ao museu.
Um musical.
Exposição de arte.
Ande.
Ande sem rumo.
A vida já tem tantos propósitos
Uma noite a esmo não vai fazer falta.
Descubra suas qualidades
Mas ainda mais seus demônios.
O melhor inimigo é aquele que conhecemos.
Diga sim para o que não quer
E foda-se onde isso pode dar.
Decore um poema.
Um verso.
Cite uma frase.
O mundo é carente de novidades.
Aprenda uma piada sem graça.
Seja só e não tenha medo da verdade.
Esqueça os clichês.
Corações solitários batem com mais dúvidas
E enfartam com fúteis certezas.
Depois volte.
Mas acima de tudo,
Nunca esqueça de ir.

Fotografia

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       As luzes da cidade embelezavam o fim de noite.
       A janela do apartamento era o único lugar que ainda sentia paz no caos de sua vida.
       Georgia On My Mind tocava no fundo escuro do quarto. Roupas largadas pelos cantos, em cima dos moveis e cama. A iluminação vinha toda de fora, do maldito poste de luz do outro lado da rua que atrapalhava a visão das estrelas em dia de céu limpo. Ela vestia uma camisa velha branca, parecia que tinha sido feita na segunda guerra em algum campo de concentração sujo e triste, e tragava seu cigarro canábico sem pressa de bater. Nada além disso.
       Quando foi que a vida ficou tão complicada?
       Seu corpo se fundia com as sombras no escuro do quarto e a fumaça sumia pela janela incomodando algum vizinho moralista e cheio de convicções. A camisa só chegava até aquela dobrinha onde começa a parte de trás da coxa dando um ar sensual aquela triste solidão. O momento fazia com que a infelicidade de tantos fracassos se tornasse poética e suportável.
       Num solavanco sua atenção é roubada. Uma derrapada e um estrondo. As luzes da cidade se apagam e seu quarto já não é o único sombrio.
       Ela ensaia um sorriso rápido e levanta seus olhos para o céu poderosamente estrelado. Orion lhe cumprimenta e as Plêiades acenam seu brilho.
       O Universo pertence aos fracassados.

Plumas, penas e prisões

  - ... três meses de prisão preventiva.. O promotor vestia esses lenços pretos no pescoço, uma espécie de babador ao contrario. Faltava-l...