quarta-feira, 14 de outubro de 2020

O Amor é uma Tragédia

 



- “O amor não vale a pena, mas o que seriamos sem ele?.”

Me selou e voltou o olhar ao palco admirando o espetáculo.

Aquela era a terceira peça de Shakespeare do festival e os intervalos de cada uma geravam discursões sem fim. Hamlet “minha favorita” dizia ela repetidas vezes era a da vez.

- As pessoas tem uma visão errada de romeu e julieta -  disse ela quando saímos da última peça – pensa comigo; todo esse romance durou cinco dias. Romeu tá triste por que acaba de sofrer de amor e na sua solidão vê julieta e pronto, um novo amor traz sentido novamente a romeu enquanto todo mundo fala que tá errado. Um amor pra esquecer outro.

- Não tinha pensado nisso.

-  Ninguém pensa. Na verdade uma boa parte da nossa noção de amor vem de coisas que a gente nem faz ideia. Romeu e Julieta fala de muita coisa, mas amor com certeza não é uma das principais.

- Mas não deixa de ser fofo.

- Claro que não. O amor não vale a pena, mas o que seriamos sem ele?. Eu digo isso mas sou uma incrédula apaixonada, tipo um ateu que agradece a deus por cada vitória. Não acredito nesse amor de Romeu, eu to mais pro amor de Hamlet. Inclusive você vai adorar, é a minha favorita.

“É agora”, falou baixinho apertando minha mão como se eu não estivesse olhando. O ator erguia um crânio em punho lentamente; “ser ou não ser? Eis a questão.” Eu podia sentir ela balbuciando seu trecho favorito.

- Hamlet era um estoico – falava sem parar na fila antes de entrarmos - Suas indagações são sempre muito sensatas e toda a peça fala muito sobre a gente. Posso dizer que é clássico, porque nunca para de dizer o que tem pra dizer. Algumas pessoas questionam o amor dele por Ofélia, e é ai que eu digo que ta tudo errado. Amor é continuidade, é racional porem intenso. Mas não confunda, ele via a vida como uma “enorme prisão, cheia de células, solitárias e masmorras” mas ainda sim que temia as “dores do coração e das mil mazelas naturais a que a carne é sujeita”...

- Você decorou ou tá inventando?

- Te falei que é minha favorita. Você ta me ouvindo? – me tapeou no ombro.

- Claro. Eu e o resto do teatro.

- Foda-se. Quer saber, nossa vida é uma grande tragédia. E se eu pudesse escolher, seria como Ofélia. Adoraria ficar louca de amor por um Príncipe apaixonado igual Hamlet. Os romeus que morram.

Com o tom pálido e enfermo da melancolia - continuava o ator deitado no chão a minha frente - E desde que nos prendam tais cogitações, Empresas de alto escopo e que bem alto planam, Desviam-se de rumo e cessam até mesmo
De se chamar ação.”.

- É isso – cochichou no meu ouvido – o amor tem que ter um ar de tragedia. A louça é sua hoje.

E me beijou a face.

“O que ela deve pensar sobre Lady MacBeth?”


Plumas, penas e prisões

  - ... três meses de prisão preventiva.. O promotor vestia esses lenços pretos no pescoço, uma espécie de babador ao contrario. Faltava-l...