“O senhor tem cinquenta centavos?”
Odeio quando o caixa faz esse tipo de pergunta. Adoentado
com discalculia crônica, esse tipo de indagação só serve para me humilhar em público.
Foi nesse dia, saindo de uma padaria com sete pães de sal, que a divindade me
disse adeus.
Do contrário de muitos, minha retirada do rito religioso não
foi devido a algum tipo de revolta ou indignação com o sistema opressor e toda
essa essa ladainha. Muito menos a ignorância de me achar superior aos que
pensam assim na ideia de que esse pensamento é retardatário. A única atribuição
para tal feito, foi simples, singela. Deus simplesmente não está interessado em
minha pessoa.
Antes de mais nada, eu digo; Durante toda minha vida, lutei
para acreditar na existência do Pai Celestial Criador do Universo e Guardião da
Vida. Li, reli e esquadrinhei cada religião ou rito que me ajudasse nessa
esperança. Cheguei ao ponto de nem considerar o deus cristão pois já entendia
que só era a primeira camada de várias outras que viriam a se desfazer. Descobri
tantos paraísos e tantos infernos. Descobri que todo mundo vai pro inferno da religião
de alguém. Descobri que a fé só faz sentido para o crente. Cheguei a encontrar
meu próprio “deus”, aquele livre de qualquer vínculo filosófico religioso. Persegui
milhares de deuses e nenhum me deu uma singela piscadinha de aceitação. Após todo
esse tempo, lutei para continuar crendo na ideia ingênua e particular que em
algum momento magico a luz da espiritualidade me incendiaria e eu enfim me tornaria
o grande locutor de uma caminhada cética que teve seu triunfo aos pés do
criador (ou criadores). Anos de história não me deixaram continuar. Aceitar que
tudo aquilo não existia doía meu coração. Não podia ser, sempre foi tão forte,
eu sempre senti, eu sempre acreditei, eu tinha certeza. Onde foi parar tudo?
A necessidade humana em terceirizar suas responsabilidades
nos fizeram ser extremamente criativos na arte da imaginação. Em todo traço minúsculo
dos Sapiens na história do universo, tudo que vejo é uma histeria em massa que transcende
gerações e desvincula qualquer tipo de realidade e responsabilidade. Tudo que
eu sempre senti quando acreditava em deus continua aqui. Todos os sentimentos,
esperanças, amor, fé, cura, paz, tudo, absolutamente tudo ainda está aqui
dentro. Porém, com um medo terrível de aceitar essa verdade, tudo é meu. Nada
nunca foi de fora. Meu impulso de ser melhor nunca foi deus. Eu sempre fui deus
de meu próprio universo e estranhamente sempre tive medo dessa
responsabilidade. Assim como uma boa parcela dos religiosos.
O peito estufa e a boca se enche quando um ateu afirma sua
filosofia, eu porem, chorei. Olhei para o céu com respeito e disse adeus. Assim
como os padres faziam. Tenho certeza que deus entenderia, se ele existisse. Hoje
entendo que pertenço ao conglomerado de vida que ocupa a finidade desconhecida
do espaço, só isso. É triste sabermos que não somos especiais. Que alguém de
outro mundo ou dimensão não liga para o que você faz ou fala, melhor, que na
verdade isso nem existe. É como uma brincadeira de criança que chega ao fim. A esperança
no amanhã não está mais na crença de que poderes sobrenaturais irão me ajudar,
e isso meus caros, é libertador.
Não quero com isso insultar ninguém, não sou nem um pouco
digno disso. Muito menos convencer qualquer um de minha ideia. Meu objetivo
maior é ter paz. Entendo a grande preocupação de meus amigos e próximos com meu
bem estar após a morte e agradeço. Continuem torcendo, a vida continua girando
e tudo que se pensa hoje pode mudar amanhã. A descrença em deus não me torna
amigo de satanás, apesar de conhecer alguns demônios. É apenas mais uma ideia nessa
mixórdia de santos e humanos.
Se um dia algum desses deuses quiserem me castigar pela audácia,
prefiro o inferno do que o paraíso de um ditador.